Tenho observado, em diversos momentos, uma grande confusão no que diz respeito ao uso de módulos de controle, gestão de qualidade, inspeção de sistemas ERP ou de sistemas MES, aqui chamados genericamente de “Módulos QM”, e seus benefícios para os laboratórios.
Declarações como as citadas abaixo me fizeram refletir e tentar esclarecer neste artigo as diferenças e a complementariedade de Módulos QM e sistemas LIMS:
“Meu laboratório já usa o QM, portanto não preciso de um LIMS.”
“Estou com receio de perder os avanços que já obtive com o LIMS, pois a área de TI informou que o ERP vai substituir todos os sistemas da empresa.”
” A direção disse que vão implementar o QM, portanto não precisarei de LIMS.”
Bom, se você já teve alguns desses questionamentos, é necessário explanar alguns pontos.
Os “Módulos QM” foram desenvolvidos para permitir às áreas de qualidade da empresa (GQ – Garantia da Qualidade e CQ – Controle de Qualidade) a integração aos demais processos da empresa de forma ágil e confiável. Entende-se aqui por “integração” a comunicação com o laboratório sobre quais lotes devem ser analisados e a comunicação à produção dos resultados de análise, pois em geral – salvo em personalizações -, os Módulos QM NÃO contemplam a maior parte dos processos e rotinas analíticas dos laboratórios de controle da qualidade, visto que estes sistemas não foram projetados e desenvolvidos para esse fim.
Já os sistemas para automação e gestão de laboratórios, aqui chamados genericamente de LIMS, foram projetados com foco nos processos laboratoriais em si, com o objetivo de promover o aumento da produtividade e da qualidade, bem como a redução de custos do laboratório por meio da sistematização e automação dos processos de controle da qualidade.
As informações que chegam ao laboratório e os resultados de análise que são devolvidos às áreas de produção não somam mais do que 10% do volume total de dados gerados, tratados e armazenados dentro de um laboratório. Portanto, a utilização de Módulos QM sem o uso de um sistema LIMS no laboratório estará cobrindo somente cerca de 10% das informações laboratoriais. Isso sem tocar ainda em questões tão ou mais importantes, como a automação da aquisição de dados de equipamentos, o tratamento de amostras de controle de qualidade analítica, insumos e equipamentos de análise, cálculo automático dos resultados de análises a partir dos dados brutos, atendimento de requisitos de normas específicas para laboratório, como a ISO 17025, entre muitos outros aspectos cruciais para a eficiência, produtividade e qualidade de um laboratório de controle de qualidade.
Um exemplo prático que indica o quanto um sistema LIMS é otimizado para o uso em laboratórios, foi um estudo prático de viabilidade conduzido por uma grande indústria química de renome internacional, que indicou que o tempo de realização das atividades no myLIMS (LIMS avaliado no caso em questão) foi de 29% do tempo necessário para a realização das mesmas atividades no módulo QM de um dos maiores e mais conceituados ERPs do mundo.
Atualmente, os sistemas LIMS têm um papel de vital importância nos laboratórios de controle da qualidade da indústria moderna, eliminando pilhas e pilhas de papéis (muito comuns em laboratórios) e, consequentemente, o desperdício de tempo e os erros associados aos processos não automatizados, viabilizando excelentes resultados e retorno do investimento ao laboratório e ao processo industrial. Com sistemas LIMS, o laboratório de controle de qualidade potencializa a entrega de resultados confiáveis no menor tempo possível, para que operadores e gestores da produção possam tomar as decisões certas no tempo certo, gerando assim ganhos não só ao laboratório, mas ao processo industrial como um todo.
Com o uso de sistema LIMS, pode-se garantir:
O papel básico de um Módulo QM é gerenciar a qualidade em nível corporativo tratando dos materiais (tipos de amostras), seus planos de controle e especificações, bem como o gerenciamento e criação de lotes de inspeção (amostras), registro dos resultados finais das características (análises) dos lotes de inspeção, disposição e movimentação de estoque dos materiais representados pelos lotes de inspeção.
Estes módulos, por terem como objetivo e estrutura de controle de qualidade baseada em lotes, normalmente só conseguem gerenciar amostras de matérias-primas e de produtos acabados e, em alguns casos, produtos semiacabados.
Como funcionalidades similares as dos sistemas LIMS, salvo personalizações dos Módulos QM, podem-se indicar:
Visto que um Módulo QM trata da qualidade em nível corporativo até a interface com o laboratório, enquanto um sistema LIMS trata do processo laboratorial em si com pouquíssimas intersecções de funcionalidades, fica evidente que tais sistemas são complementares, portanto não excludentes.
Durante a última década, a maioria dos laboratórios industriais no mundo inteiro teve que manter ou desenvolver planilhas eletrônicas e registros em papel para preencher as lacunas de registros, controles e rastreabilidade deixada pelos Módulos QM de sistemas ERP, sistemas estes que foram vendidos como solução integrada para toda a empresa.
Como tais soluções alternativas em geral foram e são muito limitadas, cada vez mais laboratórios se utilizam de sistemas LIMS integrados aos Módulos QM e demais sistemas corporativos, de forma a obter o melhor dos dois mundos: maior eficiência nas rotinas laboratoriais e integração total do laboratório às demais áreas da empresa.
Basta verificar que é praticamente nulo o número de laboratórios industriais que têm seus processos analíticos bem atendidos e automatizados com uso de Módulos QM. Isto ocorre porque os laboratórios de controle de qualidade têm especificidades e necessidades que somente sistemas e empresas especializadas em automação e gestão de laboratórios normalmente podem atender, por entender dos processos, das normas relacionadas, da linguagem do laboratório, podendo assim prover soluções adequadas e orientadas as suas especificidades.
Pelas razões acima expostas, fica evidente que, na maioria dos casos, o melhor caminho é a implementação de um sistema LIMS para atender os processos laboratoriais e de controle da qualidade a fim de melhorar a eficiência do laboratório e integrar o sistema LIMS ao Módulo QM do sistema ERP ou MES, garantindo assim rápida troca de informações com as demais áreas da empresa.
Sim, por meio de personalizações ou “customizações”, algumas empresas tentam adequar os Módulos QM para atender as peculiaridades de laboratórios. Entretanto, tal alternativa deve ser criteriosamente analisada, pois têm pelo menos as seguintes desvantagens:
Esta é uma brincadeira que ilustra muito bem a estratégia da maioria das empresas fornecedoras de ERPs ou MES e seus módulos que dizem que atendem todas as áreas e tudo é possível, basta é claro, personalizar o produto. O ponto é: sabe-se lá com que esforço, que custo total e durante quanto tempo.
Portanto, vale a pena pensar muito bem no assunto e verificar na prática experiências reais de laboratórios de empresas nacionais que utilizam Módulos QM de sistemas ERP ou MES fazendo às vezes de sistemas LIMS. Compare e comprove na prática a diferença no nível de eficiência e automação de laboratórios com sistemas LIMS.
Notas
1 – Personalização: Alteração do software para atendimento das necessidades específicas de um cliente por meio de alteração de seu código fonte, gerando assim outra versão do software focada a realidade do cliente. Também chamado de customização (do inglês, custom).
2 – Tabela comparativa referencial com base em recursos padrão normalmente encontrados em Módulos QM e em sistemas LIMS. Variações podem ocorrer em função de caraterísticas especiais e/ou personalizações de alguns módulos ou sistemas.
DADOS DO AUTOR
Georgio Raphaelli | Ex-Diretor Técnico na Labsoft Tecnologia
sobre gestão laboratorial, controle de qualidade industrial, saneamento, tendências e tecnologia no seu e-mail.